segunda-feira, 8 de dezembro de 2014

Livros da nossa biblioteca

www.leyaonline.com

   A minha tia Clara tem um coraçãozinho de oiro, não desfazendo. Sempre me lembro dela a contribuir para tudo o que é peditório e campanha de bem-fazer, a comprar lençóis de linho e panos de tabuleiro bordados "pelas meninas do orfanato, coitadinhas", que umas freiras de vez em quando iam mostrar lá a casa, indiferente aos resmungos do meu tio Ernesto que, na sua qualidade de velho republicano, socialista e ferozmente laico, a queria fazer entender que não era assim que as coisas se resolviam.
   Todos os meses a minha tia Clara sentava-se à mesa da casa de jantar a separar o dinheiro que destinava às meninas do orfanato, à Senhora Belmira que era a pobrezinha que às quartas-feiras lhe batia à porta, aos pobres da Conferência de São Vicente de Paula, a uma prima afastada que ia lá jantar aos domingos, a cada uma das dezassete afilhadas que logo no princípio de cada mês lhe entravam porta dentro a pedir a bênção e, se possível, mais qualquer coisita - isto para não falar das moedas que me mandava deitar, sempre que à nossa frente a gente encontrava uma horrorosa estatueta de gesso com um menino loiro ao lado de um menino preto, abanando a cauda à medida que as moedas caíam pela ranhura, sob a qual se lia "Ajudai as Missões".
Pezinhos de Coentrada
Alive Vieira

Sem comentários:

Enviar um comentário