Francisco José Martinho dos Santos tinha 30 anos. Vivia em condições miseráveis com a mulher, de 21, e o filho, de 4 na "ilha" de Campanhã que o público retratou na reportagem SOS na Zona Pobre. Fransisco José, feito "homem fantasma" numa rixa que o deixou impossibilitado de trabalhar, esperava que a Câmara do Porto lhe atribuísse uma casa. Esteve perto de o conseguir, mas um engano deixou a família a viver entre as mesmas paredes podres. Francisco José morreu à espera. José António Pinto, técnico assistente social da Junta de Freguesia de Campanhã, conhecido como o "Chalana", deu a notícia ao autor da reportagem, o jornalista Paulo Moura, nesta quinta-feira, através de uma carta que publicamos na íntegra:
O Zé Francisco partiu. Faleceu ontem no Hospital de S. João. Quando a grande reportagem do jornal PÚBLICO foi editada, já se encontrava internado. Mesmo sendo severamente pobre e castigado por estas políticas sociais, o Zé sonhava ver o Ivo crescer, a Sara sorrir com dentes novos e passar já o próximo Natal numa casa digna e decente cedida pela Câmara Municipal do Porto. Soube hoje desta triste notícia pela boca do seu filho, que me procurou com a avó no posto de atendimento do Bairro do Lagarteiro para me dizer “Ó Dr. Pinto, o meu pai já saiu do hospital, mas agora não podes falar mais com ele. Foi para o Céu. Quando eu for grande e se me portar bem, ele volta.” Peguei neste menino de óculos novos e fomos passear de carro. Ouvir música, lanchar, desenhar, jogar computador. Devolvi-o à mãe de olhos encharcados às 19h30. Já era noite, tudo estava escuro e triste naquele portão da ilha. O Zé era muito novo. Merecia ter vida e vida em abundância. O sistema esmagou-o, não lhe deu oportunidades nem recursos, não permitiu que ele realizasse os seus sonhos, não lhe proporcionou as mínimas condições dignas de sobrevivência, não foi justo com as suas reivindicações. O Zé chorou no hospital quando percebeu que estava a chegar ao fim, semanas antes tinha-se revoltado no Gabinete do Inquilino Municipal quando a técnica gestora do seu pedido de casa o informou que a chave do novo tecto ainda estava demorada. Nesse dia chorou de raiva. A sua dignidade e os seus direitos foram ao longo destes anos sendo enterrados, hoje o seu corpo também foi para debaixo da terra.
Aquele abraço fraterno,
José António Pinto (Chalana)"
in Jornal Público
Sem comentários:
Enviar um comentário